sábado, 26 de junho de 2021

À espera do teu sorriso

 

                                                                                       Ilustração de Cristina Malaquias

Já não é primavera.

Deixou-nos e viajou mascarada.

Esteve um ano, dois anos, mascarada. É tanto tempo! Penso que ficou magoada.

Um dia, contarás que a primavera se cansou de não lhe vermos o sorriso.

E que apesar disso,

Saltou à corda nos jardins.

Brincou com barquinhos de papel nos lagos.

Beijou a lua nas noites felizes.

Sonhou e enamorou-se do sol.

Sonhou e enamorou-se do mar.

Deixou-se abraçar pela chuva.

Deitou-se nos campos de flores.

Perfumou os dias cinzentos.

Florida, aqueceu corações.

Dourou o olhar e chamou todas as cores.

Mas alguém lhe viu o sorriso?

E tu dirás que chorou todas as dores.

Mas quando regressar, a bela primavera não virá mascarada.

Virá colorida e não ferida.

E tu sorrirás com ela.

Celeste Almeida Gonçalves

sábado, 19 de junho de 2021

terça-feira, 15 de junho de 2021

O Duende e a Cabana


                                                                                                                        Ilustração de Sandra Serra

Numa grande árvore com fartas folhas verdes, tronco para abraçar e vigorosos ramos, um jovem duende construiu uma cabana, que de vermelho pintou e onde um tesouro guardou.  

Instalada firmemente na acolhedora árvore, aquela casinha de sonho, tinha horas infindáveis de paciente trabalho.

O suor escorrera durante dias e dias pelas faces deste aprendiz de carpinteiro. As suas mãos ficaram calejadas pelo manejo das ferramentas, as pernas doridas e as costas derreadas, por causa das pesadas tábuas que carregou.

Ficara linda a cabana, bordada pela folhagem, com porta e janela para o céu azul espreitar, as estrelas e a lua contemplar.

Mas passou por aquela árvore, varreu os campos, em fúria, um monstro endiabrado, que parecia o vento irado. Era enorme este ser malvado. Desgrenhado e de olhos esbugalhados, tinha boca de caverna e corpo de  rochedo. Que medo!

Cruel, o monstro desajeitou o sonho do duende e, furioso, à cabana arrancou a alma, tábua a tábua.

Abandonada pela sorte, foi a cabana caindo, atirada em arremesso por aquele ser impiedoso, até restar desmanchada no chão.

Tinha o monstro debandado, quando o duende, dela se abeirou e, ao ver tamanha destruição, dentro dele, um turbilhão de emoções se acendeu como um clarão.

Cerrou os dentes e as mãos, os olhos chisparam revoltados e choveram lágrimas que escorreram pelas suas faces vermelhas, até formarem um rio de raiva.

Tremeram-lhe as pernas, doeu-lhe a barriga e o jovem duende sentiu que, por vezes, a injustiça também vence.

Mas a cabana ali estava, aguardando um ser gentil que com calma e persistência, brincasse de novo com ela, consertando o desvario do  monstro, juntando as suas peças como um puzzle,  dando-lhe vida outra vez.

E sob um ameno sol, com a frescura da aragem, o duende amaciado reuniu forças, desfez a raiva e reconstruiu a cabana, vestindo-a com um luminoso amarelo.

Que encantador fica o duende, espreitando pela janela e, quantas vezes, subindo a escadinha de madeira, ruma a um novo sonho, com outro tesouro para abrigar.

Quanto ao monstro, encolheu, encolheu, encolheu, até ficar do tamanho de uma minúscula pedra. Iniciou, então, uma nova viagem, quando um menino, ao brincar, o atirou ao mar. Será que ele sabe nadar?  

 

Celeste Almeida Gonçalves


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