terça-feira, 15 de junho de 2021

O Duende e a Cabana


                                                                                                                        Ilustração de Sandra Serra

Numa grande árvore com fartas folhas verdes, tronco para abraçar e vigorosos ramos, um jovem duende construiu uma cabana, que de vermelho pintou e onde um tesouro guardou.  

Instalada firmemente na acolhedora árvore, aquela casinha de sonho, tinha horas infindáveis de paciente trabalho.

O suor escorrera durante dias e dias pelas faces deste aprendiz de carpinteiro. As suas mãos ficaram calejadas pelo manejo das ferramentas, as pernas doridas e as costas derreadas, por causa das pesadas tábuas que carregou.

Ficara linda a cabana, bordada pela folhagem, com porta e janela para o céu azul espreitar, as estrelas e a lua contemplar.

Mas passou por aquela árvore, varreu os campos, em fúria, um monstro endiabrado, que parecia o vento irado. Era enorme este ser malvado. Desgrenhado e de olhos esbugalhados, tinha boca de caverna e corpo de  rochedo. Que medo!

Cruel, o monstro desajeitou o sonho do duende e, furioso, à cabana arrancou a alma, tábua a tábua.

Abandonada pela sorte, foi a cabana caindo, atirada em arremesso por aquele ser impiedoso, até restar desmanchada no chão.

Tinha o monstro debandado, quando o duende, dela se abeirou e, ao ver tamanha destruição, dentro dele, um turbilhão de emoções se acendeu como um clarão.

Cerrou os dentes e as mãos, os olhos chisparam revoltados e choveram lágrimas que escorreram pelas suas faces vermelhas, até formarem um rio de raiva.

Tremeram-lhe as pernas, doeu-lhe a barriga e o jovem duende sentiu que, por vezes, a injustiça também vence.

Mas a cabana ali estava, aguardando um ser gentil que com calma e persistência, brincasse de novo com ela, consertando o desvario do  monstro, juntando as suas peças como um puzzle,  dando-lhe vida outra vez.

E sob um ameno sol, com a frescura da aragem, o duende amaciado reuniu forças, desfez a raiva e reconstruiu a cabana, vestindo-a com um luminoso amarelo.

Que encantador fica o duende, espreitando pela janela e, quantas vezes, subindo a escadinha de madeira, ruma a um novo sonho, com outro tesouro para abrigar.

Quanto ao monstro, encolheu, encolheu, encolheu, até ficar do tamanho de uma minúscula pedra. Iniciou, então, uma nova viagem, quando um menino, ao brincar, o atirou ao mar. Será que ele sabe nadar?  

 

Celeste Almeida Gonçalves


2 comentários:

  1. Está excelente amiga.... Eu diria que o melhor era ele não saber mesmo nadar, para não voltar a fazer o mesmo que fez ao pobre duende, que viu o seu sonho desmanchado, por algum tempo, por esse monstro que agora virou moeda.

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    1. Isabel, obrigada pelo comentário. Talvez este monstro que se tornou num monstrinho, deva ter uma segunda oportunidade. Se ele souber nadar, aonde irá parar? Podemos continuar a história... Beijinhos.

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